Dize tua relação com a dor e te direi quem és.
O ditado é de Ernst Junger, militar, filósofo e escritor alemão e pode ser generalizado para nossa sociedade atual.
Dores podem ser consideradas cifras. Elas contêm a chave para o entendimento de toda sociedade, afirma um filósofo coreano.
Segundo ele, vivemos tempos de uma angústia generalizada diante da dor. Também uma baixíssima tolerância a qualquer tipo de sofrimento.
A consequência imediata é uma anestesia permanente.
Deixamos de sentir. Deixamos de perceber o que a dor está sinalizando, pois ela é sempre um sinal, uma manifestação de algo mais profundo.
Assim, podemos dizer que vivemos numa sociedade paliativa.
Uma sociedade de indivíduos que não estão aprendendo a lidar com a dor, com as frustrações, com as contrariedades da vida.
E, no entanto, são todos fenômenos extremamente naturais e necessários para o desenvolvimento da alma.
A sociedade paliativa se mistura também com a sociedade do desempenho. Nessa, a dor é vista como sinal de fraqueza.
É algo que deve ser ocultado ou eliminado por meio da otimização.
Como consequência, podemos observar a busca do prazer desenfreado, desejando multiplicar mais momentos de bem-estar.
Tudo para mascarar as dores ocultas e evitar ter que olhá-las, resolvê-las de forma ativa.
Contudo, a dor existe e todos os que transitamos, pela Terra, a sofremos, em maior ou menor intensidade, no hoje ou no amanhã.
Cabe-nos, dessa forma, avaliarmos a relação de cada um de nós com a dor.
Importante entender seu sentido em nossas vidas, seus objetivos.
Não estamos propondo, de forma alguma, a busca intencional da dor, mas uma maneira madura e inteligente de reconhecer a sua existência e administrá-la quando se apresente.
Tudo isso quer dizer que precisamos aprender a sofrer.
Se a dor existe e nos alcança em algum momento, imprescindível que estejamos preparados para retirar dela o melhor proveito.
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A dor é o mais nobre agente da perfeição.
É indispensável à vida de todo aquele que não quer ficar petrificado no egoísmo e na indiferença.
Então, quando a dor se erguer inevitável em nosso caminho, acolhamo-la como uma amiga.
Aprendamos a conhecê-la, a apreciar-lhe a beleza austera, a entender-lhe os secretos ensinamentos.
Ao invés de nos revoltarmos contra ela ou, então, de ficarmos acabrunhados, inertes e fracos, debaixo de sua ação, acionemos o nosso pensamento ao alvo a que ela visa.
Indaguemos: o que temos a aprender com ela? Paciência, humildade, reformulação de conduta?
Procuremos tirar dela, em sua passagem por nossa vida, todo o proveito que ela pode oferecer ao espírito e ao coração.
Esforcemo-nos por sermos um exemplo para os outros, por nossa atitude na dor, pelo modo voluntário e corajoso pela qual a aceitamos, por nossa confiança no futuro.
Isso a tornará mais aceitável aos olhos dos outros.
Seria infantilidade de nossa parte nos enraivecermos contra a dor.
Tenhamos para com ela olhos diferentes. Olhos que a veem como remédio para todos os vícios, para todas as decadências, para todas as quedas!
Redação do Momento Espírita. com base no livro
A sociedade paliativa, de Byung-Chul Han, ed. Vozes
e no cap. 27, pt. 3, do livro O problema do ser do
destino e da dor, de Léon Denis, ed. FEB.
Em 21.9.2023
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