Momento Espírita
Curitiba, 23 de Novembro de 2024
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ícone Pés pequenos

A figura da avó marcou a sua tenra infância. Órfã de mãe, que morreu quando ela tinha apenas duas semanas, fora criada entre quatro irmãos.

Enquanto a avó viveu, Adeline foi defendida por ela, muitas vezes, dos irmãos que costumavam tirar do seu prato os melhores bocados, até mesmo da sobremesa que ela tanto apreciava.

Aos quatro anos, era ela quem puxava a cadeira para que a avó pudesse se assentar à mesa.

A matrona andava mancando e oscilando o corpo como se os dedos dos pés tivessem sido cortados. Na sua inocência, certa feita, Adeline colocou seu pé ao lado do da senhora para comparar o tamanho.

E foi indagando a razão dela ter pés tão pequenos que ficou ciente da milenar prática chinesa, somente abolida no início do século XX.

Com três anos de idade apenas, a avó tivera seus pés amarrados com uma faixa bem forte, com os dedos dobrados para baixo da sola, esmagando o arco, para ficarem pequenos pelo resto da vida.

Essa prática foi documentada pela primeira vez, durante a dinastia Tang, no sul da China, no século X.

Narra uma lenda que um imperador da China medieval se apaixonou pela graciosidade de uma dançarina que tinha os pés pequenos.

Assim, estabeleceu que outras mulheres, artistas, servas, seguissem a prática e a vontade do monarca.

A elite começou a acreditar que ter pés pequenos era símbolo de beleza. Por isso, as famílias passaram a submeter suas filhas a essa prática.

Disseminando-se por toda a população, a mulher que não tivesse os pés atados, era passível de exclusão social.

Com certeza, jamais teria um pretendente que com ela desejasse se consorciar.

Segundo a avó, o processo era extremamente doloroso, levando-a a gritar, implorando que a mãe retirasse a faixa, o que nunca veio a acontecer.

A partir do início do processo, a menina não podia mais correr e brincar livremente. Os pés não lhe permitiam.

A dor jamais a abandonou e, mais tarde, surgiu a artrite, como uma das consequências da deformidade provocada.

Concluindo seu relato, a velha senhora lhe disse o quanto a neta era afortunada por ter nascido trinta anos depois que o costume fora abolido.

Assim, ela podia andar sem dor, correr, pular, brincar como lhe aprouvesse.

E essa foi uma das primeiras lições de Adeline, com respeito à vida: gratidão.

*   *   *

Os que nos encontramos no planeta, na presente fase de sua evolução, devemos ser realmente gratos.

Gratos por vivermos. Gratos por tantos costumes bárbaros, opressivos, terem sido abolidos do bom entendimento humano.

Naturalmente, outros ainda machucam muitas vidas. Mas, com certeza, progredimos bastante.

Cabe-nos zelar para que práticas brutais não retornem ao palco das ações humanas.

Também para que leis que agridam a vida, de qualquer forma, não sejam implementadas.

Zelar pelo bem-estar do semelhante é manifestação de amor por nosso irmão.

Também por nós mesmos porque, logo mais, seremos Espíritos do outro lado da vida, com retorno projetado à Terra.

Voltaremos e encontraremos exatamente aquilo que semeamos no hoje.

Zelemos por leis dignas e justas. Pensemos a respeito.

 

Redação do Momento Espírita, com base no cap. 3
do livro
Cinderela chinesa, de Adeline Yen Mah,
ed. Companhia das Letras.
Em 11.3.2023.

 

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