Na manhã londrina, o salão para leilões foi aberto. A expectativa era grande, face ao anúncio de antiguidades nos lotes de ofertas.
Entre os itens, estava um violino escuro e sujo. O leiloeiro o mostrou e, com entusiasmo, o descreveu como uma peça de raro valor.
Era um genuíno Cremona, fabricado pelo famoso Antonio Giacomo Stradivari. Logo, os presentes duvidaram da autenticidade da peça. Afinal, não havia a assinatura Stradivarius.
Embora a explicação de que, inicialmente, ele não assinava suas criações, a consideração geral continuou a mesma.
O valor oferecido foi tão baixo que mereceu do leiloeiro a reclamação de que jamais venderia aquela raridade por preço tão vil.
Enquanto as manifestações se sucediam, de um lado e do outro, um homem de meia-idade, alto, magro, vestindo um casaco de veludo, entrou na sala e caminhou na direção do leiloeiro.
Tomou o violino entre suas mãos e, com seu lenço, limpou o instrumento. A atenção estava concentrada nele, agora.
Com habilidade, ele reajustou a tensão das cordas, levou-o ao ouvido, como se desejasse escutar alguma coisa.
Finalmente, colocou o violino, ao ombro, na posição correta e o arco feriu as cordas, enquanto um murmúrio se fez uníssono: Paganini.
Sim, ali estava o compositor e o maior virtuose do século XIX. Um dos criadores da estética musical romântica.
Uma melodia suave invadiu a sala e, na medida em que os acordes alcançavam os ouvidos, a emoção tomava a todos.
Quando a música cessou, a disputa foi acirrada, os lances, sempre mais ousados, aconteceram.
O instrumento fora desprezado, até o momento em que o mestre colocara nele as mãos e extraíra o encanto da sua sonoridade.
Aquela gente desconhecia seu valor, não tinham a mínima ideia da sua autenticidade.
Somente quando o virtuose extraiu dele os sons quase divinos, eles puderam perceber quão valioso era.
No entanto, quem arrematou o instrumento, naquela tarde, foi o próprio Paganini.
*
Nós podemos nos considerar como esse violino. Muitos nos olham e não nos concedem valor algum.
Somos pessoas simples, desataviadas, sem beleza invulgar, nem dotes extraordinários.
Somos pais e mães do mundo, profissionais competentes, trabalhadores dedicados. Nada de grandioso a se ressaltar em nós.
Mas, quando o Mestre nos toma nas mãos e permitimos que Ele acione as cordas dos nossos valores morais, mostramos a música que em nós reside.
Ele, o Mestre, conhece nossa intimidade. Sabe das nossas lutas para a superação das paixões inferiores, sabe das batalhas para nos mantermos honestos, nobres, em nossa vida.
Quando Ele executa a música da Sua Boa Nova, alguns poderão ouvir a melodia que brota das nossas almas.
O Mestre dos mestres extrai de nós o melhor, bastando que nos deixemos manusear por Ele.
Tornemo-nos o violino de Jesus, o Dono da seara. Permitamo-nos que Ele use Seu arco de amor nas cordas dos nossos sentimentos, da nossa boa vontade.
Então, muitos poderão se encantar e beneficiar com a melodia do amor.
Deixemos que o Mestre extraia de nós a mais doce música para aliviar as dores do mundo.
Redação do Momento Espírita, com base em narrativa colhida
no cap. 4, do livro Quando tudo falha, de Rodolpho Beltz,
ed. Casa Publicadora Brasileira.
Em 22.10.2021.
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