Momento Espírita
Curitiba, 23 de Novembro de 2024
busca   
no título  |  no texto   
ícone Um sonho que findou

Imagine se um dia o homem inventasse um aparelho para escutar pensamentos! Imagine que esse aparelho pudesse detectar os pensamentos de quem se prepara para nascer. Se isso acontecesse, é possível que ouvíssemos algo mais ou menos assim:

Enfim, vou realizar o meu grande sonho! Um sonho grandioso demais para mim. Para algumas pessoas, pode parecer banal porque, com certeza, elas nem sequer compreendem como ele é precioso.

Mas, é o meu sonho. O meu desejo mais intenso: viver. Depois de muitos, muitos planos, muito tempo de expectativa, vou viver!

Vou ganhar a vida como oportunidade inestimável para crescer, aprender, realizar, amar, ter a chance que todos têm de construir e gravar na Terra sua passagem por ela.

Vou nascer. Faltam alguns meses, mas eu já estou completo há semanas.

O dia de eu ver a luz do sol, de sentir o ar entrar em meus pulmões está perto. Ah, como deverá estar a cor do céu nessa hora?

Estou ansioso para sentir o cheiro de minha mãe. Qual a cor dos seus olhos? O que será que verei primeiro: o seu sorriso de felicidade ou a sua lágrima de agradecimento a Deus?

Quem irá me balançar primeiro no colo, ela ou papai? Meu pai! Como será sua voz, suas mãos? Decerto devem ser grandes, bem maiores do que as minhas. Assim eu me sentirei bem protegido e amparado.

Vou adorar correr pela casa, procurando você, mamãe. Vou tomar banho cantando e rir de suas brincadeiras.

Você me verá perder o primeiro dentinho e tomará da minha mão para me ensinar a desenhar as primeiras letras. E eu vou escrever bem bonito, bem grande, dentro de um coração: mamãe!

*   *   *

Sonho, sonhei até há pouco. Mas hoje meu grande sonho foi transformado em pesadelo. Gritei por minha mãe porque ouvi dizer que a gente grita pela mãe, quando está com medo.

E eu tive tanto medo. Gritei. Mas ninguém me ouviu! Fui sentindo cada golpe da lâmina afiada. Encolhi-me, tentei fugir, mas não tinha para onde ir.

O ninho quente de amor se transformou numa câmara ensanguentada de morte.

Nem em todas as guerras se planejou câmara mais eficiente de matar. Um lugar onde o condenado não tem voz, não pode correr, não tem como se defender e nem querem saber se ele está sentindo alguma coisa.

*  *  *

Sonhei um sonho impossível. Sonhei um sonho de vida e amor. Sonhei estar aí, com você, mamãe.

O sonho acabou, a vida foi apagada e uma grande dor ficou em seu lugar.

Já não sei se voltarei a sonhar um dia. No momento, faço parte daqueles que não têm o direito de sonhar com a vida.

Mas quem sabe você encontre nas crianças que conseguiram viver e foram abandonadas, alguém que tenha sonhado como eu e que está à espera de um colo arrependido e cheio de amor.

*   *   *

Quando formos abençoados pelas missões da maternidade e da paternidade, jamais cogitemos de destruir a vida que ainda não desabrochou no mundo.

Não pensemos nos embaraços e nos problemas que eventualmente tenhamos que enfrentar. Ao contrário, pensemos nas tantas alegrias com que a Divindade nos brindará através das carícias de ternura das mãozinhas delicadas e dos risos infantis que nos encherão os ouvidos.

E não esqueçamos que um dia nós também batemos à porta de um coração materno, rogando pousada. Porque ele nos acolheu, agora estamos aqui, eu a falar e você a me escutar.

Pensemos nisso.

Redação do Momento Espírita, com base no texto
Aos que sonham, de Cristina Damma F. Dias, da
revista
Harmonia, número 84, de outubro 2001.
Em 27.9.2013.

 

 

Escute o áudio deste texto

© Copyright - Momento Espírita - 2024 - Todos os direitos reservados - No ar desde 28/03/1998