Nós a vimos, um dia desses. E a ouvimos. Tratava-se de um espetáculo com entrada franca, promovido por instituição espírita benemérita.
Ela adentrou o palco e a plateia ficou muda. Fora anunciada como solista de algumas óperas famosas e com trabalhos valiosos em técnica vocal. Currículo longo, invejável, que o mestre de cerimônias fez questão de exaltar, em detalhes.
Com um sorriso nos lábios, recebeu a luz dos spot-lights. Nada, em sua aparência, denotava tristeza, esforço físico.
Andou até à frente do palco, amparada pelas muletas. Postou-se, olhou para o maestro e abriu a boca. E cantou... com alma, mente e coração.
A flauta que trazia engastada na garganta foi acionada em escalas harmoniosas.
A música sacra que lhe brotou dos lábios nos remeteu a Bach que, um dia, afirmou: O único objetivo de toda música deve ser a glória de Deus e uma recreação agradável.
Para ele, a música era um ato de adoração, como se as notas, depois de saírem do alcance do ouvido humano, continuassem a subir para os céus, num hino de louvor.
Enquanto ela emocionava a plateia, com sustenidos e bemóis, ficamos a pensar em quantos de nós nos consideramos inúteis, por sermos portadores de pequena deficiência visual, por termos dificuldade para andar mais rápido, por necessitarmos colocar uma prótese dessa ou daquela natureza.
Mas Liane, a solista, é uma mulher independente. Em seu carro adaptado, ela se locomove para todos os lugares.
É mestranda em música na área de cognição, filosofia e educação musical, canto solista e canto coral no Curso de Licenciatura em Música da Faculdade de Artes do Paraná.
E canta, sorrindo. Toca a alma das pessoas. Projeta a voz, louvando a vida, a Divindade, o seu dom.
* * *
Um exemplo de vida. Um exemplo de que a vida deve ser vivida em totalidade, não importando condições.
Dificuldades existem para serem superadas. Para o Espírito demonstrar que ele é o comandante do corpo, o diretor da vida.
O Espírito é que determina o tipo de vida que deseja. Por isso, há quem se sinta frustrado, menos aquinhoado e se entregue a cuidados alheios, em total dependência.
E há os que idealizam para si mesmos a superação e causam admiração aos homens pelas suas conquistas.
Esses vencem, apesar de tudo, e se transformam em pessoas felizes. Por vezes, em criaturas que fazem muitas outras mais felizes.
E quando se os vê cantando, lecionando, pintando, produzindo, nem nos apercebemos que a pessoa é portadora dessa ou daquela deficiência.
São exemplos de tenacidade, de perseverança.
Espelhemo-nos neles, fortalecendo em nós a vontade de estudar, aprender, produzir, crescendo sempre.
Redação do Momento Espírita, com base em fatos da vida da
cantora lírica Liane Guariente, residente em Curitiba, Paraná.
Disponível no CD Momento Espírita, v. 24, ed. FEP.
Em 2.1.2020.
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