A menina pequena começou a perceber o jardim de sua casa.
Encantou-se com uma flor de cor vermelha – bougainville.
Ainda no colo, pediu ao pai para chegar mais perto. Desejava ver com as mãos e sentir seu perfume.
Ao puxar um pequeno galho colorido, a maioria das pétalas se desprendeu acidentalmente. Estavam agora na palma da mão pequenina.
Havia deixado o ramo da planta escarlate quase sem vestes. A criança se assustou. O galho retornou velozmente para trás.
Olhou para o pai como que dizendo: Não pretendia machucá-la...
Logo após fez um gesto inusitado. Esticou o bracinho, segurando na mão as pétalas soltas que ainda guardava e buscou novamente as flores que haviam permanecido no galho.
Ela queria devolver o que havia retirado da flor, agora semidesnuda.
O pai ficou sem ação. Seu primeiro impulso foi dizer que não era possível, no entanto, aceitou o desejo da filha e deixou que ela ajeitasse delicadamente as partes arrancadas junto às que ainda se mantinham no arbusto.
Enfim, a menina deu a situação por resolvida. O pai, porém, não. Ficou com as pétalas arrancadas no pensamento.
* * *
É possível devolver uma pétala para uma flor?
Os botânicos certamente dirão e provarão que não. Uma vez retiradas, não voltam mais. Não há como colar, costurar ou provocar qualquer espécie de regeneração.
Assim como o tempo; assim como as palavras que proferimos; assim com os atos. Não há como desfazer o que foi feito, o que foi dito, o que passou.
Ferimos alguém profundamente e pedimos desculpas. Será que somos nós tentando devolver pétalas arrancadas?
Assim, voltemos à questão original: é possível devolver uma pétala para uma flor?
Tudo nos leva a aceitar o não como a resposta mais razoável, ou a única plausível. Resposta triste.
Porém, se a ingenuidade e pureza infantis acreditaram ser possível, quem sabe possamos acreditar tornar possível, mas de uma forma diferente.
E se decidíssemos cuidar daquela árvore de uma maneira especial, olhando-a todos os dias, assim como o Pequeno Príncipe um dia cuidou de sua rosa?
Estarmos atentos ao que ela precise e não deixar que lhe falte alguma coisa. Vamos nos ocupar do solo, mantendo-o fértil.
Conversarmos sempre, dizer o quanto está bela, acompanhar seu crescimento e lá estarmos, emocionados, quando finalmente, novas pétalas nascerem no lugar das faltantes.
Quem sabe será nossa forma de devolver...
E se não pudermos restituir exatamente aquela flor por alguma razão, poderíamos cumprir nossa missão da mesma forma, com outras. Entendendo que nossa dívida é com a natureza como um todo.
* * *
O homem sofre sempre a consequência de suas faltas. Não há uma só infração à Lei de Deus que fique sem a correspondente punição.
Desde que o culpado clame por misericórdia, Deus o ouve e lhe concede a esperança. Mas, não basta o simples pesar do mal causado.
É necessária a reparação, pelo que o culpado se vê submetido a novas provas em que pode, sempre por sua livre vontade, praticar o bem, reparando o mal que haja feito.
A sua felicidade ou a sua desgraça dependem da vontade que tenha de praticar o bem.
Redação do Momento Espírita, com base na crônica
Das pétalas arrancadas, de Andrey Cechelero e no cap. XXVII,
item 21 do livro O Evangelho segundo o Espiritismo, de
Allan Kardec, ed. FEB.
Em 24.10.2019.
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