O homem estava caído, com a cabeça ensanguentada. Pedro parou seu carrão e, pelo celular, chamou a ambulância.
Aproximou-se. Para estancar o sangue, rasgou um pedaço de sua camisa de linho e enfaixou a cabeça do ferido.
Quando a ambulância chegou, ele entregou seu cartão para um dos enfermeiros, pedindo que ligasse para dar notícias do pobre infeliz.
Dias depois, recebeu um telefonema. O enfermeiro Márcio avisava que aquele andarilho teria alta. Seu nome era José Carlos e não tinha familiares na cidade.
Pedro não sabia porque se interessava tanto por aquele homem. Foi ao hospital, entrou na enfermaria e aproximou-se da cama do seu protegido.
Pedro se identificou como o que o havia socorrido na rua. O atendido se emocionou. Há muitos anos ninguém se interessava por ele.
Era o homem mal cheiroso do qual todos buscavam se afastar. Lágrimas lhe umedeceram os olhos e romperam em choro convulsivo.
Pedro ficou ali parado, esperando aquele ser humano dar vazão a sua dor, que parecia reprimida dentro dele. Depois, pediu para que contasse a sua história, se assim desejasse.
José Carlos falou do pai alcoólatra, da mãe que, cansada das agressões, abandonou a família, deixando o irmão e ele nas mãos do pai.
Lembrou da fome, do irmão menor chorando, das sovas que levavam por motivo nenhum.
Um dia, depois de uma grande surra, apanhou o irmãozinho pela mão e saiu andando, prometendo que jamais voltaria para aquela casa.
Depois de muito andar, o pequenino começou a chorar. Suas perninhas doíam pelas chineladas que havia recebido, pelo cansaço. Sentia fome.
José Carlos tinha onze anos e bateu na porta de uma casa. Uma mulher de cabelos brancos, muito bonita, atendeu. Vendo o sofrimento nos olhos daquelas crianças os acolheu.
Ele nunca estivera em uma casa tão linda, nem jamais comera comidas tão gostosas.
À noite, entre os lençóis limpos, aquecido, pensou que no dia seguinte, com certeza, eles teriam que ir embora.
Mas se ele, o maior, desaparecesse, é possível que a mulher ficasse com seu irmão, tão pequeno.
Então, no meio da noite, fugiu, levando como lembrança uma meia do irmãozinho.
Nos dias seguintes, à distância, ficou acompanhando as saídas da senhora conduzindo Pedrinho.
Foram ao parque, às compras, ao mercado. Ela o segurava pela mão. Ficara com ele.
Satisfeito, José desapareceu daquela cidade. Nunca esqueceu aquela mulher-mãe que os acolheu.
Tornou-se andarilho. Muitos anos depois, retornou à cidade e ao casarão.
A família havia se mudado e ele nunca mais soube do irmão.
Foi aí, entre lágrimas, que percebeu que Pedro também chorava.
Em suas mãos, retirada da carteira de couro, José Carlos reconheceu o pé de meia do seu irmão, aquele que fazia par com o que ele carregava até hoje, como lembrança.
Sem falar nada, se abraçaram, e todos que ali passavam se emocionavam.
Quando souberam da história, choravam de alegria. Ainda hoje, naquele hospital, se fala da história de amor de um irmão que renunciou a tudo pela vida do irmãozinho.
Atualmente, os dois dirigem um lar que abriga crianças em situação de risco, a quem têm oportunidade de dar carinho e proteção.
O lar funciona naquela mesma casa bonita, onde um dia José Carlos deixou seu irmão Pedro, na esperança de que ele pudesse ter amor de mãe, bem maior do que qualquer tesouro.
Redação do Momento Espírita, a partir
de história de autoria ignorada.
Em 10.7.2018.
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