Um homem adquiriu uma casa antiga. Mais de um século de construção, mas bem conservada.
Contudo, logo que entrou na edificação, se deu conta de que muitos consertos eram necessários. Um detalhe aqui, outro ali.
E, com certeza, ela precisava de uma pintura nova. Por isso, ele decidiu retirar a tinta antiga e começou a raspar as paredes, a cor velha, um azul sujo e desbotado.
Para sua surpresa, na medida em que ia retirando a cor azul, foi aparecendo por baixo uma outra cor, rosa, mais velha do que a anterior.
Raspou tudo. Aí apareceu uma terceira camada de tinta, cor creme. Depois o branco.
Ele foi descobrindo que cada morador que por ali passara, pintara a casa da cor que lhe agradava, sempre cobrindo a anterior.
Constatando isso, ele decidiu descobrir qual seria a cor original daquela velha casa.
Obstinado, pacientemente, foi retirando camada por camada. Finalmente, quando acabou o seu trabalho, teve uma grande surpresa.
Mais bonita do que qualquer tinta, havia uma madeira linda, o maravilhoso pinho de riga, com nervuras formando arabescos cor castanha contra um fundo marfim.
Ficou encantado e profundamente feliz – pinho de riga puro, sem nenhuma mão de tinta. Um tesouro para ser admirado.
* * *
Nós somos como a casa velha, com camadas e camadas de tintas de cores diversas.
Para cada ocasião, apresentamos uma das cores: o azul para os momentos de alegria, o rosa para aqueles serenos, harmoniosos, o vermelho para as horas turbulentas...
As pessoas, que privam do nosso cotidiano, nos conhecem de uma ou de outra forma, dependendo das horas que estejam conosco.
Alguns dirão que somos alegres, outros que somos muito sérios, outros ainda, que somos agitados, tensos.
Tantas são as cores para os períodos mais diversos que, por vezes, nós mesmos temos dificuldades em descobrir como somos realmente.
Somos o amarelo do intelecto, o verde das festas ruidosas, o branco envelhecido dos dias de cansaço?
Quem somos, afinal? Como somos, de verdade?
Importante que nos autoconheçamos, que saibamos em profundidade dos nossos sentimentos, das nossas aspirações, dos nossos pensamentos.
Autoconhecimento. E, com um detalhe muito importante: saber que não somos um corpo que anda, fala, trabalha, executa tarefas, se locomove de um para outro lado.
Somos um Espírito imortal. Sim, o pinho de riga puro. A essência imortal.
E esse Espírito imortal é quem sente, pensa, idealiza e conduz o corpo com todas suas camadas grossas ou finas de diferentes pinturas.
Definirmo-nos como ser humano integral é o que nos compete. Permitir que apareça, com toda sua beleza, esse pinho de riga puro, com seus arabescos maravilhosos.
Descobrir que precisamos retirar a camada rude da nossa indiferença para deixar que o fundo marfim do amor se apresente.
Extravasar em ação nossa vontade de aprender, nosso intuito de melhorar, de apresentar o que tenhamos de melhor para esse mundo maravilhoso em que se movimenta o corpo que comandamos.
Essência imortal, filhos de Deus, herdeiros da Sua luz e do Seu amor.
Redação do Momento Espírita, com base no
cap. 5, pt. 1, do livro Um céu numa flor silvestre,
de Rubem Alves, ed. Verus.
Em 24.11.2017.
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