Quando a guerra acabou, George entrou com seu regimento na Alemanha. Ele integrava um grupo designado para um campo de concentração perto de Wuppertal.
Foi a experiência mais chocante da sua vida. Ele estava encarregado de prestar socorro médico àqueles recém-libertos.
Caminhar no meio daquelas cabanas onde milhares de homens haviam morrido, ao longo dos anos, era um horror.
Pior era constatar os efeitos da inanição progressiva que, a cada dia, apesar da medicação e da alimentação, levava grande número deles para a morte.
Foi ali que George conheceu Bill Cody. Assim o chamavam porque tinham dificuldade em pronunciar seu nome polonês.
O que chamava atenção nele era que, apesar dos seis anos de dieta, de fome e de viver naquelas cabanas insalubres, sem ar, ele não aparentava a menor deterioração física ou mental.
Era espantoso, ainda, verificar como todos os grupos do acampamento o consideravam um amigo.
Isso era raro, levando-se em conta que aquele aglomerado de prisioneiros de todas as nacionalidades se odiavam mutuamente, quase na mesma proporção que odiavam aqueles que os haviam aprisionado.
Falando fluentemente o inglês, francês, alemão e russo, tão bem quanto o polonês, ele se tornou uma espécie de tradutor para as tropas de ocupação.
A sua compaixão pelos companheiros de prisão brilhava em seu rosto.
Qual seria o seu segredo? - Perguntava-se George.
Certo dia, em que se sentou ao seu lado, tomando um caneco de chá, Bill contou a sua história.
Morávamos no bairro judeu, em Varsóvia: minha esposa, nossas duas filhas e três garotos.
Quando os alemães chegaram à nossa rua, alinharam todos contra o muro e abriram fogo com as metralhadoras.
Supliquei para morrer com minha família. No entanto, porque eu falasse alemão, eles me colocaram num grupo de trabalho.
Ele fez uma pausa. A voz ficou embargada, enquanto olhava à distância, como se estivesse revendo a esposa e os cinco filhos.
Depois continuou: Naquele momento, eu precisei decidir se odiaria os soldados que tinham feito aquilo.
Não era uma decisão fácil. Eu era advogado. Minha prática, mais de uma vez, me havia mostrado o que o ódio podia fazer às pessoas.
Aliás, fora o ódio que acabara de matar as seis pessoas mais importantes do mundo para mim.
Então, eu decidi, fosse qual fosse o tempo que me sobrasse de vida, eu iria empregá-lo no amor a toda a criatura que viesse a entrar em contato comigo.
* * *
Amar a todo ser... Era esse o poder responsável pelo bem de um homem, apesar de toda a privação vivida. Apesar de toda a dor e saudade que lhe machucavam a alma.
E ali estava ele, liberto agora, trabalhando ainda pelos outros. Eram quinze a dezesseis horas por dia, tentando resolver todo tipo de problemas.
Preocupava-se em buscar documentação, registros, a fim de relocalizar pessoas cujas famílias e até mesmo cidades poderiam ter desaparecido.
O poder do amor o mantivera saudável durante seis anos de privações.
O amor continuava a lhe reger todos os atos. Sua família, agora, eram aqueles homens, mulheres e crianças que recebiam a liberdade, e precisavam reconstruir as suas vidas.
O poder do amor...
Redação do Momento Espírita, com base no cap. 13,
do livro Voltar do amanhã, de George G. Ritchie
e Elisabeth Sherril, ed. Nórdica.
Em 4.11.2017.
Escute o áudio deste texto