O filho busca o pai no aeroporto. Entre sorrisos, se abraçam. Entram no carro.
Enquanto rodam pela estrada, o pai vai observando os detalhes da paisagem e, ao contemplar um menino tentando se equilibrar na bicicleta, viaja no tempo e confessa:
Como o tempo passa rápido... Ainda ontem você era uma criança. Agora... ei-lo um homem feito. Já não sou eu quem o busca, é você quem dirige o carro e me conduz. Sabe, filho, acho que deveria ter trabalhado menos para ver você crescer.
E, num quase desabafo, completa: Gostaria de ter uma segunda chance.
O rapaz sorri e, tranquilo, fala, como quem deseja acalmar a angústia paterna:
Tudo bem, pai. Você tem uma segunda chance.
E, apontando a esposa grávida, que os aguarda em frente à casa, onde acaba de estacionar o carro, complementa: Ele vai se chamar Gabriel.
* * *
As cenas demonstram ternura. Nenhuma reprovação.
Às vezes, amargamos a existência, fixados no passado, porque, em nossa infância, nossos pais não estiveram tão presentes quanto teríamos almejado.
Podemos chegar a culpá-los pelos nossos eventuais fracassos do agora. No entanto, se ausências ocorreram é de nos perguntarmos o que preocupava nossos pais, naquela época. Quase sempre, nos esquecemos das lutas insanas, das horas dedicadas ao trabalho para nos prover o pão, o agasalho, o conforto de uma casa, o pagamento da faculdade, as viagens de estudo e de lazer.
Sim, talvez pudéssemos ter abdicado de tantas coisas e teríamos preferido que eles estivessem ao nosso lado.
Contudo, lhes dissemos isso em algum momento ou simplesmente exigíamos mais e mais, em nossos sonhos de adolescentes e jovens?
Que os pais fazem falta aos filhos é verdade inconteste. Entretanto, que não os culpemos por tudo, inclusive pela nossa incapacidade de compreender, de desculpar e perdoar as suas possíveis faltas.
Todos os pais conscientes procuram fazer o melhor para os seus filhos. Se falham, não o fazem de forma intencional.
Enquanto inexperientes em muitas questões, detinham as preocupações da manutenção do lar, o provimento de todas as nossas necessidades, a instrução, a educação.
Nesse rol, vez ou outra, podem ter esquecido das manifestações mais ternas do afeto.
No entanto, por que nós, filhos que desejávamos o abraço, a presença, não lhes dissemos, não pedimos?
Importante que se viva o momento presente, que manifestemos nossa profunda gratidão por quem nos deu tanto.
Se nos descobrimos ainda carentes do que desejamos na infância e não tivemos, usufruamos o mais possível, agora, da presença dessas criaturas que nos deram e mantiveram a vida.
E, se estivermos para nos tornarmos pais, ofereçamos a eles a excelente oportunidade de serem avós, permitindo-lhes um tempo mais longo com os netos, tempo que talvez tenham querido mas não puderam ter conosco. A segunda chance.
A chance de demonstrar o grande amor que trazem em seu coração, chance de serem pais pela segunda vez.
Ofereçamos a eles essa infinita alegria de conviver, de amar, de levar os netos a passear, de os ensinar a se equilibrarem na bicicleta, de irem ao cinema, saírem de carro...
Tantas pequenas grandes coisas que fazem a felicidade e massageiam a alma.
Façamos isso.
Redação do Momento Espírita.
Disponível no CD Momento Espírita, v. 31, ed. FEP.
Em 22.3.2017.
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