Ele era um cavalo jovem, ágil. Pela primeira vez, iria atravessar o grande deserto. Mostrava-se ansioso e não parava de correr, batendo os cascos no chão.
Ao pé do muro, um camelo também se preparava para a grande travessia. Ele comia e comia. Feno e capim. Depois bebeu muita água.
O cavalo aproximou-se dele aos saltos:
Ô camelo, como você é feio e sujo. Vou ter mesmo que atravessar o deserto com você? Vou ser obrigado aturar sua companhia?
O camelo continuou a ruminar.
O caravaneiro selou o camelo, arrumou a carga, a água, montou o animal e partiu. O cavalo na frente, camelo atrás, devagar.
Pedra e areia. Areia e pedra. Como era longe. Como iam devagar. O cavalo, de vez em quando, galopava na frente e depois voltava ao rumo.
Você não andou quase nada! Dizia ao camelo. Você é muito desajeitado. Nem sei como o homem tem coragem de montar você. A impressão que dá é que você vai desabar a qualquer momento.
O velho animal continuava a andar calado, balançando da direita para a esquerda, da esquerda para a direita.
O cavalo continuava saindo da trilha, correndo na frente. De repente, sentiu uma dor aguda no casco. Uma pedra pontuda o tinha ferido. Voltou mancando.
O homem franziu as sobrancelhas e o animal murchou as orelhas. Daí em diante prometeu que não sairia mais do rumo.
Agora, o camelo ia na frente e o cavalo atrás, trotando como podia.
O cavalo começou a ter a impressão de que o camelo andava muito depressa. E ele estava com sede.
Ainda não havia chegado o meio-dia e a cabeça do cavalo começou a doer. Começou a cambalear, a ziguezaguear.
O camelo percebeu que ele estava quase com insolação. Piscou o olho e se agachou.
O cavalo aproveitou e veio repousar ao lado da sombra de uma das corcovas.
Daí, sentiu uma carícia úmida em sua testa escaldante. O velho camelo lambia, com sua língua áspera, o pequeno companheiro.
A tarde veio e chegou a noite. O homem acendeu uma fogueira para vencer o frio.
Voltou o dia e depois muitos outros dias.
Quando houve uma tempestade de areia, o cavalo colocou as suas narinas no pêlo espesso do camelo, para que não se enchessem daqueles finos grãos de areia.
Enquanto rugia o deserto, ele não teve medo. Sentia-se protegido, ouvindo o bater do grande coração tranquilo do camelo.
Finalmente, chegaram à terra das colinas verdes, onde um riacho amarelado corria por entre tendas de peles cobertas de lona branca.
O cavalo mal se reconheceu na imagem refletida na água. Estava cinzento, sujo, cheio de pó.
Ao seu lado, viu se refletir a cara do camelo. Piscou um olho ao cavalo, em sinal de amizade.
O cavalo olhou e não viu mais o beiço pendente, nem a dentuça feia, nem o pêlo maltratado. Viu somente os lindos e grandes olhos do amigo que o tinha ajudado a atravessar o deserto.
Camelo, falou, ganhei um pouco de sal. Vamos dividi-lo como dois velhos companheiros do deserto!
* * *
Cuidemos das nossas amizades. Nunca percamos um amigo, por desentendimento ou malcriação. Nem troquemos novos por velhos amigos. Todos são valiosos.
Amigos são a nossa segurança nos caminhos da vida.
Redação do Momento Espírita, com base no livro
O cavalinho e o velho camelo, de A.P. Fournier,
ed. Ática.
Em 20.7.2015.
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